Abordagens de contextos específicos

Como foi dito no tópico anterior, ao realizar um levantamento dos gráficos utilizados em diferentes meios jornalísticos, percebemos a adoção de modelos visuais e alguns tipos de gráficos independente da natureza do suporte visual. A questão levantada sobre a possibilidade de atualização diária dos gráficos demonstra um dos possíveis objetivos com relação a leitura de informações sobre reportar o estado geral da pandemia baseado nos dados primários.
Conforme a pandemia avança, encontramos outras abordagens editoriais que buscam realizar análises mais profundas a partir do cruzamento de metadados dos casos de Covid-19 com outros dados sócioeconômicos. Esta abordagem jornalística tem como objetivo expor e analisar mais profundamente determinados contextos e grupos sociais. Neste caso, não prevalece uma análise médica, com ênfase por exemplo, nas comorbidades, mas uma análise social com ênfase em grupos com maior vulnerabilidade. O que podemos perceber é que análises como a matéria que citamos no tópico Brasil e o Mundo sobre a vítima-padrão de Covid-19  não são possíveis de se fazer a partir dos dados brutos ou dos gráficos utilizados cotidianamente nos meios jornalísticos.
Percebemos como estas análises realizadas a partir de dados derivados ou metadados trazem representações distintas dos gráficos mais comuns. A seguir, apresentamos alguns exemplos que mostram abordagens e recursos visuais em diferentes mídias.

Meios Impressos / Estáticos

O primeiro exemplo é o gráfico realizado por Medida SP que apresenta um mapa de calor de mortes confirmadas por Covid-19 a partir do cruzamento de duas informações: a renda média domiciliar e a idade da vítima. Neste gráfico, é possível ver o número de mortes para cada subgrupo representado por cor. A partir dele é possível perceber que apesar da ocorrência de mortes ser mais alta em pessoas com maior idade em domicílios de renda média maior, as residências com menor renda apresentam um contraste muito maior.
É interessante evidenciar que o artigo que apresenta o gráfico inclui um manual de leitura do gráfico, o que reforça o argumento utilizado no tópico anterior sobre a necessidade de familiarizar os leitores à determinados gráficos.

Neste gráfico realizado pelo Gênero e Número sobre pesquisa do coletivo Vote LGBT, podemos ver a comparação entre o Índice de Vulnerabilidade entre os diferentes subgrupos analisados na pesquisa. É interessante ressaltar que o Índice de Vulnerabilidade é uma métrica que considera diversos outros fatores como acesso a planos de saúde e renda. Por ser um índice entre os valores 0 e 1, os valores são representados em uma escala linear com variação da posição no eixo x.

Interativos

O mapa interativo realizado pelo LabCidadeFau da USP apresenta dados de casos confirmados e óbitos por CEP. Cada CEP, recebe uma cor que representa o número de hospitalizações por Covid-19 por km. Cada CEP recebe o número de pontos distribuídos aleatoriamente como o número de casos confirmados. Entre os casos confirmados naquela localização, os óbitos circulam um dos pontos daquele CEP. Vemos este projeto como uma ferramenta que poderia ser complementar a alertas da prefeitura por região. Um mapa que poderia ter como um dos públicos principais os cidadãos que poderiam se atualizar sobre o estado de sua vizinhança em dados oficiais.

Um outro caso que poderia ser aplicado a estudo de políticas públicas seria o gráfico interativo criado por Samy Danas e Alexandre Simas que apresenta projeções de dois cenários distintos: a fila única entre hospitais públicos e privados ou filas separadas. Aqui a inovação não está na representação, mas na interação que permite explorar diferentes simulações. Os modelos matemáticos que permitem simulações de diferentes cenários foram abordados no tópico A matemática da pandemia deste portal.

Estudo Modelo Covid-19 Brasil de autoria do economista Samy Dana, o estatístico Alexandre Simas e tem co-autoria de Bruno Filardi, Rodrigo Rodrigues e José Gallucci Neto

No entanto, nenhum dos dois gráficos interativos mencionados permanece ativo e atualizado.

Televisão / Videografismo / Animação

Observamos que nos meios televisivos, talvez por terem matérias de duração mais curta, acabam muitas vezes por utilizar os gráficos estáticos comuns junto com explicação oral do apresentador. Porém, encontramos outras referências jornalísticas que usam vídeo como mídia para realizar análises mais longas. Importante ressaltar que essas matérias devem ter um tempo de planejamento e execução mais longos.

É o caso da matéria da TV Folha que compara as pandemias de Covid-19 e H1N1. A matéria se inicia com um gráfico de área em círculos que usa como elemento ilustrativo os caixões. Após a primeira parte, o vídeo apresenta o mesmo gráfico de linha sobre a curva de óbitos comparando as duas pandemias para evidenciar que apesar da H1N1 ter um número muito maior de óbitos, essas mortes ocorreram em um período muito mais longo, o que demonstraria a gravidade do Covid-19. Neste caso, apesar de utilizar gráficos tradicionais, a matéria usa recursos de animação e movimento de câmera para conduzir o olhar do espectador para a narração.

Conclusão

Nos parece que ao nos debruçarmos sobre os dados para uma compreensão de um contexto específico, o mergulho exigido reverbera em todas as etapas de um projeto orientado a dados. Desta forma, há necessidade de coleta ou consulta a dados socioeconômicos complementares, são necessárias mais técnicas de mineração para cruzamento dos dados e o exercício visual realizado junto com a comunicação verbal precisa de maior detalhamento para apresentação dos contextos específicos, resultando em nova aplicações e adaptações dos modelos visuais ou na adoção de outros tipos de gráficos e criação de visualizações diferentes. No entanto, observamos como há muitas análises ainda a serem feitas com a possibilidade de cruzamento dos dados primários com outros dados socioeconômicos como densidade demográfica, por exemplo. A busca por compreender a complexidade do impacto da pandemia exige uma análise multifacetada e criteriosa dos dados e da metodologia, além de uma busca por visualizações que possam concatenar mais dimensões de dados em um mesmo gráfico.

Terminamos esse bloco com questões e desafios para a representação visual dos dados da Covid-19.